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PODE UMA MÃE DESEJAR?

trajetória de uma artista-mãe-etc em formação

 

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao curso de Artes Visuais do Instituto de Artes da Universidade Federal de Uberlândia como requisito parcial para  obtenção dos graus em Bacharelado e Licenciatura em Artes Visuais.

 

Orientadora: Profa. Dra. Clarissa Monteiro Borges

Banca examinadora: Prof. Dr. Geovanni Lima da Silva e Profa. Dra. Marcia Franco dos Santos Silva

Universidade Federal de Uberlândia, Minas Gerais, Setembro de 2025.

RESUMO 

Este memorial, intitulado Pode uma mãe desejar? Trajetória de uma artista-mãe-em-formação, percorre o caminho de uma mulher e estudante de Artes Visuais que insistiu em criar, mesmo diante dos desafios cotidianos da maternidade em espaços — acadêmicos e artísticos — que tantas vezes resistem a acolher essa experiência. Entre arte e vida, os trabalhos Álbum de Família, A menina é a mãe da mulher e o filme Peixes, Búfalas & Urubus entrelaçam registros íntimos, técnicas experimentais e reflexões surgidas do corpo e da memória. Aqui, a maternidade aparece não apenas como tema, mas como uma força capaz de reorganizar o tempo, o olhar e os processos criativos, dando forma a narrativas que ecoam em outras mulheres, mães e em todos aqueles que reconhecem na arte um território de cuidado, escuta e reinvenção.

 

Palavras-chave: maternidade; memória; audiovisual; corpo; performance.

          CAOS (TUDO)

(...)

Por fim, este livro-memorial busca reunir e aprofundar no percurso da criação

da estudante-artista-mãe-etc em sua trajetória na Licenciatura em Artes

Visuais, tendo como pano de fundo todo o contexto social em que vive,

as referências aqui citadas, as disciplinas e as trocas incessantes com

docentes e discentes do curso, o trabalho de prestação de serviços em

fotografia e outras formas que uma artista cria para bancar a si e sua família,

as relações familiares, a maternagem. Enfim, a pesquisa em arte, em cuidado,

em educação, a múltipla pesquisa e imersão proposta neste relato.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

                                                                          POR FIM / PORVIR

Tudo foi feito no soluço. No intervalo. Ou ao mesmo tempo em que outra coisa muito importante também estava acontecendo. Tudo o que passou sem atraso custou sanidade mental. Tudo de leve aconteceu atrasado. (...) A maternidade é um marcador de opressão. (Albertim; Lima, 2017).

 

 

Há algo de insistência em seguir sonhando. Não se sonha apenas uma vez: sonha-se todas as noites. E deveríamos também sonhar todos os dias. Quando minha filha era muito pequena, pela dificuldade de dormir uma noite inteira, eu deixei de sonhar. Acordava esvaziada de imagens e de descanso. Restava-me sonhar durante o dia. Mas pode uma mãe sonhar, quando há um filho para cuidar?

 

Ingressar na licenciatura em artes foi, antes de tudo, um sonho – distante, quase impossível. Perguntei-me em qual configuração familiar esse desejo poderia caber. A decisão exigiu romper: divorciar-me, voltar ao Brasil, reaproximar-me da família depois de quinze anos distante, confiar em um trabalho que me sustentasse e, ao mesmo tempo, experimentar a construção de uma vida artística.

 

Sou artista? Entre a docência em formação, as tarefas burocráticas dos projetos culturais e o pouco tempo para criação, muitas vezes sinto que produzo pouco. Na pandemia, produzi gravuras e cadernos diariamente, vendia de um em um. Sempre um reinventar-se. Mas isso era ser artista? A obrigação de criar não se confunde com a experiência sensível da criação.

Hoje, com quase quarenta anos, finalizando a graduação, acompanhando minha filha no fim do primeiro setênio, sinto-me diante de mais um fechamento de ciclo. Sempre que um ciclo acaba, a urgência da mudança me atravessa. Antes, sem filha, eu mudava tudo: de cidade, de casa, de trabalho. Agora não é tão simples. Ainda assim, mulher, mãe, artista, licencianda, sonhadora: como posso seguir sonhando? No fim das contas, ter tempo, criar uma obra, gestar um processo criativo, escrever um memorial, fazer um livro, é um grande privilégio.

 

A solidão da mãe solo é real – a solidão da artista que não tem plano de carreira, nem um caminho estabelecido. Busco liberdade ao mesmo tempo em que carrego o peso da responsabilidade das minhas escolhas, que afetam a mim, à minha filha e à família ampliada. Ao meu lado, felizmente, existe uma rede: coletivos de mães, coletivos de artistas, a família de sangue, os amigos do praia, as mulheres da lua, a universidade com docentes e discentes, sem a qual nada disso seria possível. Mas, no fim das contas, quando volto para casa, somos eu, minha filha, as gatas e as plantas.

 

A rotina é corrida, estressante, injusta. A conta nunca fecha. Nunca daremos conta de tudo. Aprendo, a duríssimas penas, a escolher qual prato deixar cair. Essa consciência foi se impondo também durante a escrita deste memorial, entre questionamentos: seria possível produzir um memorial interessante aos olhos dos outros? Existe diferença entre um memorial descritivo e um artístico? Trabalhar com memórias em imagens e textos é um caminho para a arte? Seria esse trabalho um portfólio? Ou será que nada disso importa, se o que importa é o processo – olhar para os trabalhos e conquistas sem apagar as dificuldades e as marcas da maternidade solo em espaço acadêmico?

 

Não tenho todas as respostas. Talvez a conclusão esteja sempre adiada, como o próprio tempo que segue. A pesquisa não se encerra aqui. Ela seguirá em movimento, entre a vida, a arte, a maternidade e os sonhos.

 

A arte, irmã da imaginação, é um religare. Escrever, associar imagens e palavras, criar processos – É quando me sinto viva. Ainda que o capitalismo capture o sensível e transforme sonhos em obrigações, sigo insistindo em sonhar. Porque, apesar do cartaz amarelo que diz que neste país é proibido sonhar, sigo escrevendo e criando para manter meus sonhos vivos – e, com eles, minha vida, e daqueles que estão ligados a mim.

 

 

malu,

 

uberlândia, 19 de setembro de 2025

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